
Primeiro perguntou-me se preferia a flauta doce ou a travessa. Por mim gostaria de começar pela doce mas não deixaria de querer conhecer a outra. Então ele veio, munido das duas e deslumbrou-me com a magia da música que parecia contar-me histórias de ninfas e de pastores. Tocava em graves suaves, cheios; em registos médios, brilhantes, melodiosos; e prometia agudos penetrantes, claros e precisos.
O meu lirismo passa imediatamente de presto a prestíssimo, quando um homem pega no seu instrumento e executa melodias que tiram a respiração a qualquer mortal. Porém, nunca me tinha passado pela cabeça que um flautista pudesse ser interessante fora do palco. Não é por nada mas acho-lhes sempre algo de pã, provavelmente pela associação lexical do deus com os outros. Não era o caso.
O meu lirismo passa imediatamente de presto a prestíssimo, quando um homem pega no seu instrumento e executa melodias que tiram a respiração a qualquer mortal. Porém, nunca me tinha passado pela cabeça que um flautista pudesse ser interessante fora do palco. Não é por nada mas acho-lhes sempre algo de pã, provavelmente pela associação lexical do deus com os outros. Não era o caso.
Chamei-lhe encantador de serpentes, num murmúrio dito ao ouvido, o que o deixou ainda mais brilhante na execução.
À medida que as ondas sonoras se propagavam pela sala, passavam do ouvido à alma e da alma ao corpo, que vibrava, qual metrónomo, com o andamento moderado de tão magnífica flauta.
Entusiasmada com tamanha harmonia era já eu que comandava os andamentos pedindo, nos meus gestos insaciáveis, o ostinato rítmico, acompanhando o cânone em oitava de modo a tirar partido dos meus agudos. Nessas alturas ele acelerava e quando já ia em 60 semínimas por minuto tive de pegar na batuta com as duas mãos e reduzir-me ao pianíssimo, ou a música terminava logo ali.
À medida que as ondas sonoras se propagavam pela sala, passavam do ouvido à alma e da alma ao corpo, que vibrava, qual metrónomo, com o andamento moderado de tão magnífica flauta.
Entusiasmada com tamanha harmonia era já eu que comandava os andamentos pedindo, nos meus gestos insaciáveis, o ostinato rítmico, acompanhando o cânone em oitava de modo a tirar partido dos meus agudos. Nessas alturas ele acelerava e quando já ia em 60 semínimas por minuto tive de pegar na batuta com as duas mãos e reduzir-me ao pianíssimo, ou a música terminava logo ali.
A flauta é ágil e costuma ser o instrumento usado em passagens rápidas e salteadas – ele tinha-me avisado – mas eu tinha replicado dizendo-lhe que um flautista precisa de saber ter controlo sobre a natureza do seu instrumento, sob pena da peça perder qualidade.
Deliciei-me, pois, um pouco mais, em verdadeiro adágio, atenta à maneira como ele rangia o frulatto ou como usava os dedos tapando e destapando os orifícios para modificar o comprimento da coluna de ar e obter, assim, sons múltiplos, soprados em registos andantes. Usava a embocadura a rigor, no ângulo certo, acrescentando virtuosismo ao desempenho.
Depois, sim, foi a altura ideal para o vivace, fortíssimo, num vibrato extremo como eu não supunha que algum flautista fosse capaz.
Deliciei-me, pois, um pouco mais, em verdadeiro adágio, atenta à maneira como ele rangia o frulatto ou como usava os dedos tapando e destapando os orifícios para modificar o comprimento da coluna de ar e obter, assim, sons múltiplos, soprados em registos andantes. Usava a embocadura a rigor, no ângulo certo, acrescentando virtuosismo ao desempenho.
Depois, sim, foi a altura ideal para o vivace, fortíssimo, num vibrato extremo como eu não supunha que algum flautista fosse capaz.
Romance digno de registo, este.