Imaginem isto cantado com uma voz potente, acompanhada pelo trinar de uma guitarra portuguesa. Depois imaginem o dono da voz, de lenço às cornucópias bem ataviado por dentro dos colarinhos imaculados, copo na mão, calcanhares em riste nos agudos, arrancados aos solavancos da tristeza, da traição, da saudade e da desgraça.
E a seguir palmas. Os botões do casaco é que quase fugiam, num esforço um nadinha sebento para aguentar o inchaço do peito, na altura da ovação.
Quando as luzes aumentavam de intensidade dava-se conta da névoa de fumo de tabaco. Cheirava a morcela assada e o bacalhau à lagareiro deixou no prato um rasto de enjoo regado a azeite, aliviado apenas pela languidez do olhar fadista. “Mais um jarro, que o tinto engrossa a voz!”
Não se pode dizer que houvesse grossura nos gestos, mas finura é que nunca; ele era lá desses! Naturezas invertidas só a do criado de mesa, arrastando as sílabas finais com uma mão em riste, virada do avesso. Exemplar magriço que a trenga da mesa ao lado atabafava com o busto a descoberto, numa provocação meio despida que ela sabia não colher. São malévolas as mulheres inchadas pelo excesso daquelas drogas do bem-estar fingido. Mas não era para o busto dela que o fadista olhava... Lancei-lhe eu o feitiço ou foi a nostalgia do palavreado que nos atraiu?
Abri-lhe os braços, depois do sorriso e do esbugalhar de olhos que o deixou babado. Quer dizer, não abri propriamente os braços mas prometi-lhos e ele, habituado a estas lides, não se fez rogado na resposta.
Acendi um cigarro e levantei-me. Olhei-o de frente quando o contornei, como se estivesse a desafiar o touro para uma pega de caras. Fingi que ia sair.
Quando voltei tinha-o à perna. Piscou-me o olho. A noite estava ganha.
Ainda faltava um fadista no meu currículo; a ocasião não era para esperas. Dali até a casa seria uma eternidade e ele estava com pressa de pôr a viola no saco.
A noite fora cansativa mas homem que é homem conserva o vigor pela madrugada dentro e nem o mais pintado sabe assim as manhas do encanto imediato; o fado existe!
Porém, não obstante o carro ser espaçoso … o das cornucópias cor de mel sobre o azul do atavio queria-me, primeiro, a relinchar. Só depois é que ele conseguia iniciar a performance.
E eu, que até gosto de práticas equestres, sentindo-me ali mesmo muito defraudada, rumei ao picadeiro mais próximo e larguei-o junto à box da Giovanna, a égua mais bravia da colecção de raridades do Conde da Malveira.
E a seguir palmas. Os botões do casaco é que quase fugiam, num esforço um nadinha sebento para aguentar o inchaço do peito, na altura da ovação.
Quando as luzes aumentavam de intensidade dava-se conta da névoa de fumo de tabaco. Cheirava a morcela assada e o bacalhau à lagareiro deixou no prato um rasto de enjoo regado a azeite, aliviado apenas pela languidez do olhar fadista. “Mais um jarro, que o tinto engrossa a voz!”
Não se pode dizer que houvesse grossura nos gestos, mas finura é que nunca; ele era lá desses! Naturezas invertidas só a do criado de mesa, arrastando as sílabas finais com uma mão em riste, virada do avesso. Exemplar magriço que a trenga da mesa ao lado atabafava com o busto a descoberto, numa provocação meio despida que ela sabia não colher. São malévolas as mulheres inchadas pelo excesso daquelas drogas do bem-estar fingido. Mas não era para o busto dela que o fadista olhava... Lancei-lhe eu o feitiço ou foi a nostalgia do palavreado que nos atraiu?
Abri-lhe os braços, depois do sorriso e do esbugalhar de olhos que o deixou babado. Quer dizer, não abri propriamente os braços mas prometi-lhos e ele, habituado a estas lides, não se fez rogado na resposta.
Acendi um cigarro e levantei-me. Olhei-o de frente quando o contornei, como se estivesse a desafiar o touro para uma pega de caras. Fingi que ia sair.
Quando voltei tinha-o à perna. Piscou-me o olho. A noite estava ganha.
Ainda faltava um fadista no meu currículo; a ocasião não era para esperas. Dali até a casa seria uma eternidade e ele estava com pressa de pôr a viola no saco.
A noite fora cansativa mas homem que é homem conserva o vigor pela madrugada dentro e nem o mais pintado sabe assim as manhas do encanto imediato; o fado existe!
Porém, não obstante o carro ser espaçoso … o das cornucópias cor de mel sobre o azul do atavio queria-me, primeiro, a relinchar. Só depois é que ele conseguia iniciar a performance.
E eu, que até gosto de práticas equestres, sentindo-me ali mesmo muito defraudada, rumei ao picadeiro mais próximo e larguei-o junto à box da Giovanna, a égua mais bravia da colecção de raridades do Conde da Malveira.
12 comentários:
A galope ou a trote, com uns relinchares à mistura... deve cá ter sido um fadinho dos antigos!
damelum... terá sido o cavalo negro que te levou à analogia com o corvo ( ou a corva, que aqui a gente gosta de aplicar os femininos quando são de direito;
anda de negro essa alma?
Aqui nesta casa os visitantes entram como querem, mas têm de sair coloridos. às vezes vermelhos de riso, outras apenas amarelos...
mas garanto a veracidade das aventuras, para quem ainda tiver dúvidas.
Não tenho culpa de ter sido bafejada à nascença com esta dificuldade de compreensão que me faz andar nesta vida à procura de uma alma gémea em sítios ora bons ora duvidosos, mas o que é a vida senão um risco?
mfc, recuso-me a relinchar antes de saber se o cavalo vai a trote ou a galope. Nem que ele cante o fado!
Pois, violet, freud poderia dar imensas explicações para a tua confusão. Aconselho-te a fazer um exame de consciência. E já agora vê lá como é que se acede ao teu blog, porque daqui não se consegue...
é caso para dizer: ó égua!!!!!!!!!
eu saio daqui vermelha de tanto rir...e oxalá que o dito tenha levado com ohh é égua oh égua...folhos à vista:):):)
Andas em maré de azar mulheri:)
No meu tempo fadistas era só para o engate e vá lá, vá lá! Costumam ser muito machistas para meu gosto.
Isto sem ofensa para todos os outros...
Às tantas, o ascensor só funcionava por reconhecimento de voz...;)
Mas Fausta, tens toda a razão que guitarra que é guitarra não chora sem lhe tocarem. ;)
Tudo isto existe, tudo isto é triste, tudo isto é fado. ;)
Fado triste das vielas...
:-D
Fado para mim só é bom quando bem cantado. Realmenre não é qualquer um que encanta...
(e podem fazer as analogias todas que quiserem desta observação - eu deixo! - serão provavelmente corretas)
Eu punha-o a pastar.
Gargalhadassssssssss:)))))))))
risos.rerrisos!!!
essa do relinchar acabou comigo!
bem, ainda não gosto de fado, mas quem sabe um dia, lentamente, no meio de muitos re-linchares da alma...?!
beijos e rebeijos, fausta!
Um bom foda vai sempre bem, é verdade. Cumprimos o destino de um povo para tal talhado.
Gosto de muito fado,
entre outros do canalha
e daquele balançado
ou d'outros quando calha.
Adiante; boa letra, parabéns.
e largaste muito bem...olha que esta, hein? relinchar não é propriamente digno de uma Lady...
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